O EXEMPLO DE NELSON NED E A OMISSÃO DE ROBERTO CARLOS (por Luz Dan)
Nelson Ned e Roberto Carlos são dois expoentes da música brasileira. Aclamados no exterior, respeitados pelo público internacional, têm trajetórias diferentes no Brasil. Infelizmente.
Não quero abordar o dom musical e muito menos a qualidade dos dois cantores. Gosto deles, cada um por motivos diferentes, de acordo com meu gosto musical.
Quero tocar num assunto delicado em que Nelson Ned, que nos deixou no domingo, foi um gigante e Roberto Carlos é um bebe engatinhando. É do exemplo de cada um que estou falando.
Nelson Ned era o que popularmente chamamos de anão. Uma voz maravilhosa, um cantor de alta qualidade, mas que não tinha uma imagem que agradasse o grande público, principalmente no que se refere a atributos físicos e, consequentemente, mercadológicos e publicitários. Nunca os teve, sempre fez sucesso, mostrando uma personalidade incrível. Como dizemos popularmente, era totalmente “resolvido” com esse fato. Tirava sarro de ser anão. Arrebanhava multidões pelo mundo afora. Foi feliz, fez sucesso, ficou rico.
Não há limitações para o talento. A voz, a presença de palco de Ned, sua simpatia, seu sorriso, driblavam a falta de atributos físicos. Tudo com uma coragem impressionante.
Nesse quesito Roberto Carlos é omisso e covarde. Um mito da música brasileira, respeitado internacionalmente, esconde vergonhosamente que é portador de necessidades especiais. Ainda quando criança, Roberto Carlos sofreu um acidente na linha de trem da sua cidade. Perdeu uma das pernas. Escondeu esse fato durante anos e é arredio em comentá-lo nas entrevistas. Um péssimo exemplo.
Roberto Carlos deixaria de fazer sucesso na Jovem Guarda se cantasse numa cadeira de rodas? Ou mesmo se usasse a perna mecânica (como chamavam as próteses naquela época), como sempre o fez, mas não escondesse isso de ninguém, perderia a chance de ser esse mito que se tornou?
Entendo que não. Roberto Carlos não é bem resolvido com isso e sempre partiu para a pior atitude. Com medo que esse “problema” impedisse seu sucesso, tratou de esconder e rejeitar a sua condição de portador de necessidades especiais. Não queria ser o que era comumente chamado de “deficiente físico”.
O ponto principal da omissão de Roberto Carlos é a oportunidade de dar exemplo ser jogada fora. Aliás, o cantor faz isso dia após dia. Já pensou se num evento como o Teleton, Roberto Carlos contasse para as crianças como conseguiu superar esse fato e fazer o sucesso que faz? Já pensou o quanto isso seria de grande valia para jovens e adultos portadores de necessidades especiais? Quanto isso valeria para a autoestima dessas pessoas que tanto precisam de apoio?
Roberto Carlos tem vergonha de poder comprar a melhor prótese do mundo para esconder a sua condição? Não precisa. O dinheiro que ele tem não foi roubado de ninguém. Foi conquistado com o seu talento.
Mas o exemplo poderia ser outro.
Luz Dan é jornalista, escritor e escreve às quartas-feiras no “Diálogos do Caderno “